segunda-feira, 5 de abril de 2010

O tema da justificação em Tiago e Paulo

INTRODUÇÃO

O tema da justificação é uma categoria fundamental dentro da teologia paulina. As cartas de Paulo, entre elas Gálatas e Romanos, são os escritos do Novo Testamento que melhor discorrem sobre esta questão. Por trás desta problemática relativa à justificação encontra-se a experiência da conversão de Paulo como ponto de partida para o desenvolvimento desta temática. Para que se conheça a teologia paulina sobre a justificação pela fé, torna-se necessário levar em consideração toda a sua vivência no judaísmo como fariseu, zeloso guardador da lei para, em seguida, mediante a experiência de Damasco, compreender essa virada excepcional na vida do apóstolo. A forte contraposição paulina da justificação pelas obras da lei é sinal da percepção do apóstolo que se dá conta que ninguém pode se salvar ou se justificar por seus próprios méritos. Fora esse o ensinamento que Paulo combateu fortemente no judaísmo, de que pelo cumprimento da lei de Moisés o homem não encontra-se justificado diante de Deus. A proposta de Paulo será colocar a fé em Cristo Jesus como alicerce e fundamento da verdadeira justificação.
No Novo Testamento, outro escrito que tocou nesta temática foi a carta de Tiago. Ao longo da história, muitos estudiosos da área de exegese e teologia bíblica pensaram ser a carta de Tiago uma forma de combater a teologia paulina da justificação pela fé. De fato, numa simples leitura de Gl 2, 16 e de Tg 2, 18-24, parece transparecer uma divergência teológica sobre o tema da justificação; Paulo por meio da fé: “Sabendo, entretanto, que o homem não se justifica pelas obras da lei, mas pela fé em Cristo Jesus, nós também cremos em Cristo Jesus para sermos justificados pela fé e não pelas obras da lei, porque pelas obras da lei ninguém será justificado” (Gl 2, 16); e Tiago: “Meus irmãos, se alguém disser que tem fé, mas não tem obras, que lhe aproveitará isso? Acaso a fé poderá salvá-lo? De fato, poderá objetar-lhe: tu tens fé e eu tenho as obras. Mostra-me a tua fé sem obras e eu te mostrarei a fé pelas minhas obras” (Tg 2, 14.18).
A controvérsia sobre a justificação entre Paulo e Tiago se delineia a partir dessas duas teses que serão desenvolvidas à frente.


1. A Justificação em Paulo

O tema da justificação, quando se trata dos escritos bíblicos, não é patrimônio exclusivo da teologia paulina. A centralidade paulina se dá pelo fato de ter sido ele o escritor do Novo Testamento que com maior profundidade trabalhou esse tema. Mas é necessário ressaltar que não se trata de uma criação paulina. Ele não desenvolve a teologia da justificação a partir “do nada”. Na verdade essa questão já se vem desenvolvendo desde o Antigo Testamento, onde o apóstolo encontra os elementos basilares para o desenvolvimento de sua reflexão sobre a justificação mediante a fé em Cristo. Entre esses elementos pode-se falar da centralidade dada por Israel à Lei de Moisés. A justificação na perspectiva veterotestamentária se dava única e exclusivamente pelo cumprimento da Torá. De modo sintético era desse modo que se tratava desse tema no Antigo Testamento. No Novo Testamento, contudo, dar-se-á uma maior consistência e desenvolvimento ao problema.
Em Romanos, Gálatas e Filipenses, a questão é tratada explícita e polemicamente. Paulo insiste em que a lei e as obras da lei não alcançam a justiça. “Porque nós sustentamos que o homem é justificado pela fé, sem a prática da lei” (Rm 3, 28); “Não invalido a graça de Deus, porque, se é pela lei que vem a justiça, então Cristo morreu em vão” (Gl 2, 21); “O homem não se justifica pelas obras da lei, mas pela fé em Cristo Jesus, nós também cremos em Cristo Jesus para sermos justificados pela fé em Cristo e não pelas obras da lei” (Gl 2, 16); “E que pela Lei ninguém se justifica diante de Deus é evidente, pois o justo viverá pela fé” (Gl 3, 11); “e ser achado Nele, não tendo como minha justiça aquela que vem de Deus e se apóia na fé” (Fl 3, 9). Em todos esses textos, Paulo não está se referindo à justiça do Antigo Testamento, centrada no cumprimento zeloso da Torá, e sim, à nova justiça efetivada por Cristo. Ele deixa claro que essa justificação só pode ser alcançada mediante a fé em Cristo. “Essa justiça do homem não é obra do homem por realização ou mérito, só Deus justifica o homem (Rm 3, 30). Aqueles que Deus chamou também justificou (Rm 8, 30)”. Portanto, é na perspectiva da ação gratuita e amorosa de Deus que Paulo fala da justificação mediada por Cristo. E essa só pode ser operada no homem por meio da fé. Paulo contesta uma justificação realizada por meio do cumprimento de preceitos da lei, tal como acreditavam a faziam os judeus. Nessa questão torna-se sempre necessário recordar a polêmica gerada na Galácia por judaizantes que estavam induzindo a comunidade à prática da circuncisão como meio de alcançar a justiça de Deus. É a partir desse contexto de combate aos judaizantes que Paulo vai desenvolver o tema da justificação pela fé e não por méritos próprios tal como pensavam aqueles que cumpriam as obras da lei. É em resposta aos judaizantes infiltrados na comunidade dos Gálatas que nasce na teologia paulina este princípio de salvação por meio da fé e não das obras da lei.
“Para Paulo fé é antes de tudo aceitação da mensagem da cruz, como se vê em Gl 3, 1-2, mas é também tensão para o movimento de todo ser ao encontro de Cristo, como nota o v. 16: “nós também cremos em Cristo Jesus e o v. 20 “Eu a vivo pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim”. Na carta aos filipenses Paulo retoma essa tensão mística afirmando que para “conhecê-lo, conhecer o poder de sua ressurreição e a participação dos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte, para ver se eu alcanço a ressurreição de entre os mortos (Fl 3, 10-11).
A justificação não é apenas uma livre e descompromissada adesão pela fé. Quando Paulo fala que o “justo viverá pela fé” (Rm 1, 17; Gl 3, 11) não está com isso querendo gerar uma cisão entre a dimensão subjetiva e a dimensão objetiva da fé. Não se trata de um fideísmo desencarnado da própria existencialidade humana. “Paulo não proclamou a justificação mediante uma fé que não implicava viver como seus seguidores vivessem”. A justificação na perspectiva paulina diz respeito a um novo estado de vida. Não se trata de um extrinsecismo da fé. Para Cerfaux:
A vinda da justiça e sua permanência em nós acompanham-se duma profunda transformação, que não é simplesmente uma atitude nova para com Deus, mas é ontológica, como os antigos compreendem, uma mudança de natureza. Uma justificação “forense”, decorrente duma declaração, antecipada ou não, do juízo escatológico, que Deus fizesse de nossa justiça, deixando-nos tais como éramos, pecadores, além de não ser realmente apoiada por texto algum, não corresponde às fórmulas realistas multiplicadas sob pena do Apóstolo.

Desse modo, percebe-se que a justificação pregada por Paulo diz respeito a uma intervenção de Deus que atinge todo o gênero humano. E esta ação se dá pela presença de Cristo na história humana. É ele, que de uma vez por todas, vencendo a morte de cruz e ressuscitando, restabelece o homem no convívio eterno de Deus, outrora maculado pelo pecado original de Adão. Nenhuma obra humana, nenhum esforço pessoal é capaz de restabelecer essa justificação.
Que o homem goza de aceitação junto a Deus chamada justificação, o começo e o fim da salvação, não por meio de seu próprio esforço moral nem mesmo no menor e no mais leve grau, mas inteiramente e somente por meio da amorosa misericórdia de Deus posta à disposição nos méritos de Cristo e de sua morte salvífica na cruz... A chave para essa transação definitiva foi a fé, definida como total e confiante entrega do eu a Deus, e não em si uma realização humana, mas puro dom de Deus. “A fé vem do que se ouve e o que se ouve pela palavra de Deus” (Fides ex auditu).

A Teologia paulina, portanto, centraliza todo o modo da justificação unicamente por meio da fé em Cristo Jesus. Paulo deixa claro que não há outra via por meio da qual o homem seja justificado perante Deus. Não há necessidade do cumprimento de nenhuma espécie de tarefas para tal justificação. Para Paulo, “pelas obras da lei não será justificada nenhuma carne perante ele, pois da lei vem o conhecimento do pecado (...) Sustentamos que uma pessoa é justificada pela fé, sem as obras da lei “(Rm 3, 20.28).


2. Justificação em Tiago

A carta de Tiago, diferentemente das grandes cartas paulinas, não é um tratado extenso sobre a justificação. O texto em si não trata explicitamente dessa temática que se tornou um dos elementos basilares da teologia de Paulo. Contudo, de modo especial em Tg 2, 14-26, constata-se a existência de uma tensão apresentada pelo texto de Tiago que imediatamente remete a Paulo. “Meus irmãos, se alguém disser que tem fé, mas não tem obras, que lhe aproveitará isso? Acaso a fé poderá salvá-lo? Tu tens a fé e eu tenho as obras. Mostra-me a tua fé sem obras que eu te mostrarei a minha fé pelas obras” (Tg 2, 14.18). Já nestes textos paralelos se percebe a contraposição em relação à Gl 2,16; 3,11; Rm 3, 20; 1, 17. Desse modo, numa rápida leitura dos textos, descobre-se que há uma relação de nítida oposição naquilo que se refere à justificação. Enquanto o apóstolo Paulo enfatiza a centralidade da fé em Cristo como condição para a justificação do homem (cf. Gl 2, 16; 3, 8.11.24; Rm 3, 28.30; 5, 1) Tiago enfatizará as obras da fé como condição para a justificação (cf. Tg 2, 14.21.24). Na concepção de Tiago a fé sem obras que manifestem-na não torna possível que o homem seja justificado por Deus. Mais do que uma fé centralizada na subjetividade do sujeito, Tiago chama a atenção para que não se caia numa espécie de fideísmo estéril.
“A maneira como Tiago compreende a fé corresponde ás palavras contidas no evangelho de Mateus 7, 24-27 e Lucas 6, 47-49, que fazem referência ao homem que escuta a palavra de Deus e a põe em prática, em oposição aqueles que também escutam essa mesma palavra , mas não as converte em obras. Para Tiago não basta que se reconheça Jesus como o Senhor, se não se cumpre a sua vontade”.

Sendo assim, falar da justificação em Tiago implica que o homem precisa manifestar objetivamente o resultado de sua fé (cf. Tg 2, 18). Ele está convicto de que a fé desemboca num modelo de vida cristã que leva o homem e a mulher a viverem coerentemente aquilo que acreditam. Não se trata apenas de afirmar que “o justo vive da fé” (Rm 1, 17; Gl 3,11). Para Tiago o justo viverá das obras derivadas dessa fé (cf. Tg 2, 24).
Ao citar o grande patriarca Abraão (cf. Tg 2,21) “Tiago não considera a fé dele como uma obra (Gn 15, 6, citado no v. 23; Rm 4,3; Gl 3,6), mas insiste mais do que Paulo nas obras que nascem da fé, da lei perfeita (Tg 1,25; 2, 8)”. Portanto, para Tiago, o único meio do homem ser justificado é fazer de sua vida uma concreta tradução da fé acreditada. Se a fé não produzir obras estará completamente morta (cf. Tg 2, 17). O homem não manifesta crer no Senhor apenas explicitando oralmente que tem fé. “Nem todo aquele que me diz Senhor, Senhor entrará no Reino dos céus, mas aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos céus” (Mt 7, 21). A vivência cristã nesta perspectiva de Tiago se manifesta pela concretização em obras aquilo que a fé crer. O autro é contra uma posição em que a fé é colocada numa perspectiva estritamente intimista e intelectualista. As obras são sinais que evidenciam a adesão da fé. Eles dão o fundamento e a consistência ao cristão para que este realmente viva com autenticidade o cristianismo. “Com efeito, como o corpo sem o sopro de vida é morto, assim também é morta a fé sem obras”(Tg 2, 26).
“Tiago, com efeito, não questiona que a fé tenha força justificante. O empenho dele é lutar contra uma concepção unilateral da fé, segundo a qual esta é autêntica inclusive sem manifestar-se nas obras do amor (Tg 2, 14). Para Tiago por outra parte, a fé autêntica se mostra quando coopera com as obras do amor (Tg 2, 18.22). Sem isto, a fé é inútil (Tg 2, 20) e morta (Tg 2, 17-26), pois a fé viva se manifesta nas obras de misericórdia (Tg 2, 16-25) e na obediência de Deus”. Que adianta ao homem manifestar oralmente uma tão grande fé se não é capaz de traduzir em obras de caridade esse amor manifestado? Portanto, para Tiago a fé é um modo de vida que não foge da realidade do mundo. Para ele fé é sinônimo de boas ações, boas obras e boas obras são a confirmação da verdadeira fé.


3. Elementos convergentes

As questões precedentes referentes à antítese entre Paulo e Tiago naquilo que diz respeito à justificação parece conduzir a uma divergência na compreensão do problema. E de fato foi essa a conclusão a que muitos exegetas chegaram nos últimos anos. Há aqueles que afirmam a existência de uma contraposição entre Paulo e Tiago na compreensão do tema da justificação, mas existem também aqueles, a grande maioria, que mais do que contradição, afirmam a existência de uma convergência de elementos entre ambos. Pode-se ver que há uma diferença clara no modo em que os dois concebem a mesma expressão. Quando Paulo fala de alguém sendo justificado, ele tem em vista o pronunciamento de Deus de que um pecador é justo. Mas quando Tiago usa o mesmo termo, ele tem em vista a demonstração do estado previamente justificado de uma pessoa. Ou seja, alguém demonstra, através de sua obediência, o que Deus já declarou sobre ele (cf. Tg 2, 23, citando Gn 15, 16).desse modo pode afirmar que o pensamento de Tiago não é inconciliável com o que Paulo defende em (Rm 3, 20-31; 9, 31; Gl 2, 16; 3, 2.5.11ss; Fl 3, 9). O que Paulo rejeita é o valor das obras humanas que visam a merecer a salvação sem a fé em Cristo. Essa confiança no esforço do homem para tornar-se justo ignora o fato de que é essencialmente pecador (Rm 1, 18-3,20; Gl 3, 22). E torna vã a fé em Cristo (Gl 2, 21; cf. Rm 1, 16+). Mas também Paulo admite que, recebida a justificação pela graça somente, a fé deve ser ativa pela caridade (1 Cr 13, 2; Gl 5, 6; cf. Ts 1, 3; 2Ts 1, 11; Fm 6) e cumprir, afinal, verdadeiramente a lei (Rm 8, 4), a lei do amor (Rm 13, 8-10; Gl 5, 14). Todo homem será julgado segundo suas obras (Rm 2, 6+)”. Portanto, baseado em dados bíblicos fundamentais, pode-se afirmar que a relação entre Paulo e Tiago não é antagônica. Neles se encontram elementos teológicos que se justapõem ao tema da justificação. Aos invés de contraposição entre justificação pela fé em Paulo e justificação pela obras em Tiago, percebe-se uma relação de distinção que não se opõe. Tanto Paulo como Tiago não fogem da raiz comum que dá ao homem a condição de ser justificado. Ambos falam da fé e das obras como caminhos que conduzem o homem à sua justa relação com Deus. Embora com óticas diferentes, eles não se chocam. “O problema da fé / obras é bastante importante para Paulo em Gálatas e Romanos, enquanto para Tiago é mais circunstancial”.
Sendo assim, a exegese atual é unânime ao firmar que a justificação em Paulo e em Tiago caminha numa relação de concordância. Apesar da circunstancialidade, como afirma Brown, ambos convergem para a mesma fé em Cristo Jesus. “A maioria dos autores pensa que Tiago não se opõe, propriamente, a doutrina paulina da justificação pela fé, mas a uma falsa compreensão da mesma que, fundamentam-se em alguns conceitos paulinos mal compreendidos. Realizava uma dicotomia entre a fé e a vida. uma compreensão contra a qual o mesmo Paulo já tinha polemizado na carta aos Romanos e na 1ª Coríntios”.
A Teologia de Tiago se evidencia como desmistificação dos falsos propagadores de uma fé etérea e desencarnada da vida cristã. Sendo que a carta foi escrita pelos anos 80-100 , já se havia passado as controvérsias sobre a justificação na carta aos Gálatas. Isso comprova que de fato Tiago está combatendo aqueles que estão deturpando a teologia paulina sobre a fé e sobre a justificação pela fé. Pode-se afirmar, desse modo, que a carta de Tiago não é resposta divergente a teoligia de Paulo, mas a falsos cristãos que disseminam doutrinas contrárias aquela ensinada pelo Apóstolo Paulo.


4. O Papel das obras em Tiago

Quando na carta de Tiago aparece o tema das obras, a primeira atitude do leitor deve ser o de captar de que tipo de obras ele está falando. Um dos motivos de divergências geradas no campo da teologia diz respeito ao uso por Tiago. “Mostre-me a tua fé sem obras e eu te mostrarei a fé pelas minhas obras” (Tg 2, 18). Contudo, faz-se mister questionar se os termos obras da lei em Paulo e obras da fé em Tiago se equivalem. Estão eles tratando da mesma questão? A afirmação para tal problema é negativa.
A expressão obras da lei usada por Paulo (cf. Gl 2, 16; Rm 3, 20) está estritamente se referindo a Torá judaica. Para os judeus o homem é justificado diante de Deus mediante o cumprimento dos mandamentos instituídos por Deus e dado a Moisés no Monte Sinai. Para Paulo, obras da lei implicam nesse empreendimento humano para o alcance da justificação. Em face deste tipo de ação Paulo se coloca contra, porque ninguém se justifica por suas próprias forças. Em Tiago as obras não se referem à Torá judaica. Trata-se, contudo, de um conjunto de práticas que levam o cristão a professar uma fé autêntica e frutífera. Portanto, as obras em Tiago têm um caráter de ligação entre fé e vida. Não se trata de obras como se compreende na Torá. As obras em Tiago devem ser manifestação em atitudes concretas da fé que o indivíduo professa. “Uma fé que não levasse o homem a agir com misericórdia, seria uma vã fé” (Tg 2, 17). É esta a convicção de Tiago. Não basta crer sem agir. As obras da fé são a comprovação de que o cristão assume a sua existência com compromisso e responsabilidade. Para Tiago não basta professar a fé com a boca, mas é necessário atualizar com a própria vida a experiência gerada pela fé. “As obras a demonstram a existência da fé e assim se prova que possui um valor constitutivo. A fé é subordinada às obras e não possui em si um valor próprio e nem um significado próprio”.
Tiago está dizendo que alguém pode demonstrar diante dos homens que ele tem sido justificado por Deus. Uma pessoa pode fazer isso fazendo boas obras, exatamente como Abraão fez ao sacrificar seu filho Isaque (Tg 2,21, cf. Gn 22, 9-12) bem depois de Deus tê-lo declarado justo. Tiago diz que esse episódio posterior demonstrou que a declaração de Deus em Gn 15, 6 era verdadeira e se cumpriu (cf. Tg 2,23).
CONCLUSÃO

Pode-se afirmar, mediante a explanação desenvolvida acima, que é incabível continuar destacando que entre Paulo e Tiago exista uma relação de controvérsia teológica. A pesquisa serve para melhor ajudar a compreender que cada uma deles tem em relação à justificação um modo próprio de entendê-la, mas sem contrapor-se. Na teologia de Paulo e Tiago fé e obras não podem ser tomadas como realidades estanques na vida do cristão. Não se trata de elementos que se antagonizam e vivem separadamente. O desafio para o homem que quer seguir a Cristo é conciliar em sua vida essas duas dimensões que se complementam. Quando Paulo desenvolveu uma teologia sobre a justificação, sua intenção era mostrar a centralidade de Cristo na vida daqueles que haviam aderido a fé. Não se tratava de negar as boas obras que o homem deve fazer no seu dia-dia para com os seus semelhantes. Contudo, o problema se dilatou a partir do momento que o homem depositou a sua justificação única e exclusivamente em seus próprios méritos. Sem a graça de Deus o homem nada pode. Mas com ela tudo realiza. Em Tiago isso é semelhante. Ele não nega a fé em Cristo Jesus quando convida o homem a prática das boas obras. Mas seu intuito é levá-lo a uma fé autêntica e madura que não se restringe a simples explicitação labial. Esse fora o grande problema que ele enfrentou nessa polêmica. Ou seja, havia cristão que estavam desvinculando a fé do seu compromisso com a vida. Contra tal prática de vida Tiago sabiamente combate convidando-os ao reto vínculo entre fé e obras como sinônimo de autenticidade cristã.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bíblia de Jerusalém. São Paulo, Paulus, 2003.
BROWN, Raymond E. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas. 2004.
CERFAUX, L. O Cristão na Teologia de Paulo. Tradução Pe. José Raimundo Vidigal, CSsR]. São Paulo: Paulinas, 1976.
COTHENET, E. Epístola aos Gálatas [tradução Monjas Dominicanas; revisão Olga Fleury Lombardi]. São Paulo: Paulinas, 1984.
DUNN, James D. G. A Teologia do Apóstolo Paulo. São Paulo: Paulus, 2003.
LONA, Horacio. Las Cartas Apostólicas. Buenos Aires: Editora Claretiana, 2003.
MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. São Paulo: Paulus, 2005.
SCHRAGE, Wolfgang; BALZ, Horst. Nuovo Testamento: Le Lettere Cattoliche. Brescia: Paideia Editrice, 1978.
TUÑI, Josep-Oriol; ALEGRE, Xavier. Escritos Joaninos e Cartas Católicas. Tradução Alceu Luis Orso, São Paulo: Ave Maria, 1999.

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